quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Amar em exílio

Incapaz de lidar com a ausência.
Sempre fui. Percebo a coisa como quase patológica: a ter três borrachas (nem as uso mais), cinco pedras reserva de isqueiro (quanto tempo dura uma pedra de isqueiro!), desodorantes e perfumes iguais (o medo de sair de catálogo), caixas de incensos repetidos, tubos de tinta de caneta, como se eu não pudesse usar outra qualquer enquanto não substituísse a tinta daquela. Como se eu não conseguisse mais ser eu mesma, e essas coisas são tão simples e descartáveis. O dia em que a fábrica do sabonete mudou de dono minha mãe, me conhecendo, já me trouxe oito sabonetes iguais, do estoque do mercadinho, caso parassem de fabricar.
E o medo de estragar um livro e a editora não imprimir mais exemplares por vários anos. Confesso que tenho livros repetidos.
A verdade é que eu não consigo lidar com um possível provável próximo fim das coisas, tamanha insegurança e desespero de incompletude; aquele frio atômico na espinha do viciado quando sacode a caixinha já vazia do remédio.

Perdendo um pedacinho eu sei que me desmancho no chão

Isso do que é material e consumível, isso do que eu poderia - sim - viver sem ou restituir fácil alguns dias depois (ainda que passados com certa dificuldade e insônia - a verdade é que tenho insônia até na véspera de comprar a coisa-reserva).
Agora que dizer do que é insubstituível, do que é irrecuperável, daquilo que estou perdendo neste segundo, das pessoas, dos amores, que dizer disso que tenho cada vez menos porque esgotou-se e não recuperarei mais porque deixará de existir por completo antes de mim, antes de mim!.

que não é medo do fim mas de sobreviver a ele. Existir sem. Amputada. Que é uma palavra muito feia...



"The thought of leaving you - I do not know how." - Chainsling, Pain of Salvation