quarta-feira, 2 de setembro de 2009

A pedinte

Outra madrugada uma senhora pedinte me rogou, comlicençadesculpeincomodarviu, se eu não podia contribuir, que não era pra leite pra criança, que para falar a verdade,

- eu queria comprar um refrigerante...
- Quanto é um refrigerante?
- A, deve tá 3 real.
- Credo. - respondi abrindo a carteira.

Entreguei-lhe exatos RS2,75, que era tudo o que eu tinha de miúdo. A senhora estendeu a mão já falando um muitobrigadaviu,deuste...

E nesse hiato milesimal, ela viu que eram menos que 3 reais, e eu, percebendo, virei minha cara de comoassim para o outro lado, como não querendo acreditar no que estava para acontecer, quase me arrependendo de antemão, torcendo com máxima concentração pra ela escutar sem eu ter que dizer, inconformada: "eu sei que aqui não tem três, mas é tudo que posso dar!".

Mas nesse mesmo hiato milesimal, o bom-senso veio-lhe às mãos, e, como ela não soubesse o que fazer com o bom-senso, recolheu a própria indignação com um ódio todo atrapalhado e confuso, e terminou,

- ... abençoe. - já virando as costas e indo embora, não sem eu perceber que mexia no dinheiro, contando-o, ainda sem entender.

do Subsolo

Pós-teatro Memórias do Subsolo (Dostoiévski), quero eu me fincar no meu próprio subsolo.

"O fim dos fins, meus senhores: o melhor é não fazer nada! O melhor é a inércia consciente! Pois bem, viva o subsolo! Embora eu tenha dito realmente que invejo o homem normal até a derradeira gota da minha bílis, não quero ser ele, nas condições em que o vejo (embora não cesse de invejá-lo. Não, não, em todo caso, o subsolo é mais vantajoso!) Ali, pelo menos, se pode... Eh! mas estou mentindo agora também."